Resiliência energética no Brasil: desafios e oportunidades à luz da COP30
*Por Jamil Mouallem
O novo mapa da resiliência energética é, hoje, tão geopolítico quanto climático, e tão humano quanto técnico. Quando pensamos em resiliência, muitas vezes imaginamos equipamentos robustos e planos de contingência; com a COP30 chegando a Belém, fica claro que a conversa precisa ser mais ampla: é sobre escolhas de investimento, desenho de rede, justiça climática e a capacidade de comunidades e setores de se adaptarem sem perder produtividade. A boa notícia é que o Brasil já tem alguns pilares para construir essa resiliência; a urgência é transformá-los em políticas e projetos com escala e prazo bem definidos.
Em 2024, o Brasil atingiu 88,2% de participação de fontes renováveis em sua matriz elétrica, segundo a última edição do Relatório Síntese do Balanço Energético Nacional 2025 (ano base 2024). O destaque vai para a evolução das fontes eólica e solar fotovoltaica, que juntas responderam por 24% da geração total de eletricidade no ano passado, um avanço significativo que reforça o potencial do país na transição energética, embora ainda existam desafios ligados à flexibilidade e à resiliência da rede.
Os eventos climáticos extremos e falhas recentes deixaram isso explícito: tempestades em 2024 deixaram milhões de pessoas sem energia em São Paulo, e incidentes operacionais continuaram a expor fragilidades na integração de novas fontes e na operação das redes. Esses episódios são um lembrete prático, não teórico, de que precisamos de soluções que funcionem quando o vento sopra forte, quando o sol some por dias ou aparece por mais tempo ou até mesmo quando equipamentos falham. Resiliência real é garantir que hospitais, escolas, centros de dados e pequenas empresas não parem no primeiro sinal de crise.
A resposta técnica passa por várias frentes: maior difusão de baterias e sistemas de armazenamento, modernização das subestações, digitalização com sensores e automação que permitam reconfigurar redes em tempo real e investimento em microgrids. Um estudo da Gartner, Inc. de 2024 prevê que, até 2027, as empresas da Fortune 500 transferirão US$ 500 bilhões de despesas operacionais de energia (OPEX) para microrredes, em parte para mitigar riscos crônicos de energia e atender à crescente demanda de IA. Investir em microgrids e em armazenamento não é luxo; é proteção de ativos e competitividade.
Além disso tem o fato de que números e tecnologia não bastam sem governança clara. Políticas públicas precisam coordenar licenciamento, incentivos e normas técnicas que favoreçam a integração entre geração distribuída, transmissão e consumo crítico. Isso inclui estimular modelos de financiamento que não deixem o ônus da resiliência exclusivamente nas costas de consumidores menores, pense em linhas de crédito verdes para cooperativas, subsídios condicionados a critérios de equidade e programas de capacitação técnica regional. A COP30 é a oportunidade política de articular essas agendas entre governos, sociedade civil e setor privado.
Finalmente, resiliência é também social: comunidades vulneráveis são as primeiras e mais afetadas quando a luz se vai. Projetos bem-sucedidos combinam infraestrutura com planejamento urbano, comunicação de risco e formação local, porque uma bateria sem gente que saiba operá-la ou mantê-la perde valor. Precisamos de uma visão que una clima, energia e desenvolvimento humano: redes que sejam ao mesmo tempo limpas, inteligentes e inclusivas. É o tipo de legado que a COP30 deveria estimular, não apenas decisões de curto prazo, mas um mapa de ação que o Brasil possa seguir nos próximos 10, 15 anos.
Se quisermos chegar lá, o movimento exige três compromissos simultâneos: priorizar investimentos em flexibilidade e digitalização; alinhar regulação e incentivos de modo a acelerar armazenamento e microgrids; e garantir que a resiliência seja medida também por impactos sociais, não só por megawatts. A matemática é simples: redes mais inteligentes e distribuídas significam menos perdas, menos impactos socioeconômicos e mais capacidade de absorver choques climáticos. O desafio é operacional, político e cultural, mas, honestamente, também é uma oportunidade enorme para o Brasil transformar sua vantagem renovável em segurança energética real. E isso, convenhamos, vale muito mais do que acender um gerador temporário: é acender o futuro com previsibilidade e justiça.
*Jamil Mouallem ?é sócio-diretor Comercial e de Marketing da TS Shara indústria nacional fabricante de nobreaks, inversores e estabilizadores de tensão e protetores de rede inteligente.

















